A sopa dos ricos

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Francisco Queirós

O IVA é o mais cego dos impostos. Aplicado a produtos, bens e serviços que adquirimos, tanto paga o rico como o pobre. A pouca justiça ainda possível num imposto deste tipo é a criação de taxas reduzidas para produtos e bens essenciais e de taxas intermédias para produtos, bens ou serviços que importa proteger. O leite, o pão, a carne, os cereais, o consumo de electricidade eram vistos como bens e serviços essenciais à vida de todos os cidadãos, extremamente pesados nos orçamentos dos menos abonados, e como tal sujeitos a taxas reduzidas. O sistema, como todo o bom sistema que nasce torto, foi tendo perversões, taxas graciosamente aplicadas a certos produtos, a Coca-Cola é um exemplo. O golfe a que se tem aplicado a taxa reduzida é por ventura para os responsáveis políticos uma actividade desportiva de primeira necessidade que urge incentivar e por isso proteger de custos elevados dada a sua prática frequente pelos mais desprotegidos nos bairros sociais das cidades!

A Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) está profunda e justamente revoltada. O aumento das taxas de 13% para 23% será uma “chacina” para o sector, denuncia, acrescentando que “é um tiro no pé na receita fiscal”, já que o Estado, segundo as contas da AHRESP, perderá 1450 milhões de euros de receitas fiscais. Além disso o agravamento do IVA, neste sector, levará ao encerramento de 54 mil estabelecimentos e à extinção de 120 mil postos de trabalho!

Que se apoie o golfe, a Coca-Cola ou as motos de água como se fez e como se fossem o mesmo que o pão, o leite ou o arroz e não os instrumentos musicais era muito mais que uma palermice! É, queiramos ou não, a marca de classe! Sim, que nunca como hoje, se sente tão viva não só a diferença das classes sociais como tão acesa a luta de classes que muitos gostariam que fosse um fetiche ideológico de outras eras, mas que a vida e a crise demonstraram serem parte da crise e da vida! E agora a electricidade é taxada da mesmíssima forma que as jóias! Essa é a realidade! E um pratinho de sopa comido ao balcão de um desses horrorosos “pronto-a-comer” ou num confortável restaurante sofre a mesma taxa de imposto que o caviar, o champanhe ou um colar de pérolas e diamantes! Sofrer em verdade sofre o que só tem ou tinha dinheiro para a sopa. Quem comprava produtos de luxo irá continuar a fazê-lo! E a sopa que não se queixe por ser um produto de luxo! Afinal, viver com o mínimo de dignidade é já um luxo. Não tarda que se taxe, sem direito a percentagem reduzida, o ar que se respira, como se faz ao que se come e à água que se bebe.

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