Falta de fé na igreja e crise financeira levam cada vez mais pessoas ao exorcista

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Foto Luís Carregã

Nada fazia prever aquele gesto. Maria (nome fictício) estava ajoelhada perante a imagem de Jesus Cristo crucificado. No altar, a água benta, o sal exorcizado, os óleos sagrados e o “Ritual dos Exorcismos”, muito semelhante ao usado pela igreja romana. O exorcista fez o sinal da cruz e iniciou a oração da bênção.

“Num ápice, ela saltou da cadeira como se fosse um gato e atirou-se a mim para me meter as mãos ao pescoço”, conta o padre Humberto Rolo. Foi no passado fim-de-semana, mas as marcas ainda são visíveis. “Fez-me este arranhão jeitoso na cabeça”, mostra, entre um sorriso.

Priorado de São Jorge

Em São Frutuoso, uma aldeia de caminhos estreitos e íngremes, localizada às portas de Coimbra, não faltam histórias que envolvem espíritos diabólicos e forças ocultas. E nem de propósito: é na rua das Alminhas que tudo acontece. Foi ali que, em 2009, o padre ortodoxo Humberto Rolo fundou o Priorado de São Jorge. É um dos três padres habilitados à prática do exorcismo em Portugal.

Os “clientes” de Marco de Canaveses

Desde então, não param de chegar pedidos de ajuda. No dia em que a reportagem do DIÁRIO AS BEIRAS visitou o priorado, cruzou-se com uma família de Marco de Canaveses. Pai, mãe e filha. A rapariga, de 22 anos, não come, não consegue trabalhar, o corpo, fraco, em prostração.

Anda a ser acompanhada por um psiquiatra há cerca de meio ano, mas as melhoras tardam. Vai daí, após terem visto uma reportagem na televisão sobre o padre exorcista, fizeram-se à estrada. Até S. Frutuoso, o carro contabilizou 160 quilómetros.

“Diz que é mal de inveja e aconselhou-a a rezar e a acender uma vela. Só Deus a pode curar”, conta a mãe.

O pai leva um saco com artigos religiosos que custaram cerca 20 euros. Pelo atendimento, pagou 50. “Vamos ver se valeu a pena”.

Pessoas vindas de norte a sul do país

Os pedidos de ajuda têm aumentado nos últimos meses. Desde janeiro, o padre Humberto Rolo já atendeu mais de 700 pessoas. As razões – diz – prendem-se, sobretudo com a falta de fé e com o momento de crise.

“As pessoas sentem-se desamparadas. Pensam que por não terem emprego, alguém está a fazer-lhes mal. E também há casos de pessoas com doenças meramente físicas, mas que metem na cabeça que têm tudo e mais alguma coisa. A igreja tem obrigação de desmistificar essas situações”.

Acontece, porém, que o exorcista recebe pessoas vindas de norte a sul do país, de vários países da Europa (Suiça, Polónia, França, Itália…) e até emigrantes portugueses que vêm propositadamente dos EUA e do Canadá.

Possessão demoníaca

No Priorado de São Jorge, antes de qualquer exorcismo, é preciso fazer uma consulta de diagnóstico. “Depois há certos dados que são o fio condutor que nos fazem perceber se aquele caso é ou não admitido para os casos da igreja”, adianta o sacerdote ortodoxo. Os casos, esses, são hierarquizados sendo que o mais grave é aquele que a indústria cinematográfica exibe “quase sempre de forma exagerada”.

Na possessão demoníaca uma entidade extraterrena – o demónio ou almas de defuntos – pode tomar conta do corpo da pessoa”, assegura Humberto Rolo.

Os casos de possessão completa são muito raros: em mil casos, pode haver 20. Ou seja, cerca de dois a três por cento e os sintomas podem ser os mais variados: mudanças de comportamento, doenças… “Aos poucos e poucos, a vida física, social, moral vai-se degradando. E há, até, casos mais extremos, provocados e documentados – de morte”, garante.

Demónios e bruxarias

De acordo com o exorcista, existem apenas duas razões que conduzem a estas perturbações. “Ou por ação direta do demónio ou por causa da prática de bruxarias realizadas por terceiros”, afirma.

Quando é preciso fazer um trabalho de libertação – adverte – esse trabalho deve ser feito em equipa, através das bênçãos e com muita fé e oração por parte da pessoa “possuída”.

Durante os rituais, já lhe aconteceu de tudo: foi cuspido, mordido, pontapeado, arranhado. Sabe que tem uma profissão de risco. Mas, ao contrário do diabo – que foge da cruz – , o padre Humberto garante que vai continuar a sua missão. Por Deus.

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