Miminhos

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Francisco Queirós

Andamos angustiados, tristes. A consumirmo-nos num desespero surdo, numa revolta interior que é corrosiva, embora ainda não explosiva. A cada dia que passa, os portugueses vêem agravar-se as suas condições de vida. E sem que consigam perceber até onde lhes será exigido que padeçam. Nunca é fácil pedir ou impor sacrifícios. Mas um povo percebe que tem de sofrer quando está em guerra, quando uma guerra termina e a estrutura produtiva está destruída, depois de uma enorme catástrofe, de uma hecatombe. Dificilmente consegue entender uma crise que vem do nada ou nasce da ambição de se ter tudo e que caminha sabe-se lá para onde e ao serviço de quem. Ainda se no meio de tanto pontapé lhe fossem dados alguns mimos, talvez o fardo fosse minimamente suportável. E não é que os governos de aquém e além-mar percebem a urgência do mimo. Afinal, sempre é urgente o amor! E miminhos dão-se! Há mesmo quem os ache excessivos.

Um dos homens mais ricos do mundo, Warren Buffett, escreveu no “New York Times” que era altura de aumentar os impostos aos “mega-ricos” como ele. Buffett esclarece que em 2010 pagou 7 milhões de dólares de impostos, pouco mais de 17 por cento dos seus rendimentos, enquanto, diz, isso é uma percentagem menor do que o que paga qualquer dos colaboradores que trabalham no seu escritório, entre 33 e 41 por cento. Coisas de norte-americanos! E rebate de consciência de um confesso “mega-rico”.

Mas Buffett bem podia viver em Portugal. O que afirma para o seu país é no essencial, mais ou menos uns trocos, o que se passa em Portugal. Não me parece que Amorim ou Belmiro concordem, nem tão pouco acredito que os principais banqueiros pensem semelhante coisa. Sei é que a Banca paga impostos mais baixos do que a mercearia ou a tabacaria da minha rua, do que qualquer pequeno comerciante da baixa. Sei é que todos vamos pagar, de igual modo, mais cara a electricidade e o gás, e que nem todos recebemos de igual modo. Sei é que se alguém aufere salários de cento e cinquenta e tal mil euros por ano paga, e justamente, 46,5 por cento de IRS, mas paga o mesmo que alguém que receba um milhão. E também sei que se esse rendimento provir de investimentos só paga 21,5 por cento e que se não paga nada de milhões provenientes de mais-valias bolsistas através de SGPS e investimentos em offshores. E sei também que o imposto extraordinário que roubará grande parte do subsídio de Natal aos portugueses excluirá os rendimentos de capital. Sei, sabemos, e não está certo!

Em tempo de crise, dêmos graças! Afinal “eles” sabem que ainda assim é possível ir dando alguns miminhos…

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