Francisco Queirós
Queria telefonar-lhes, mas fiquei conhecedor dos enormes riscos que corria. Telefonar não é nada seguro. Assim, optei por escrever. Pelo menos sei ao que vou. E dei comigo a pensar no sem-sentido da apreensão. Os homenzinhos das gravações estão demasiado entretidos a escutarem as conversas dos ministros. Que disparate, já não há homenzinhos para tarefas dessas! Há máquinas simples e poderosas ou poderosamente simples ou simplesmente poderosas que registam as conversas. E essas máquinas, na suspeição do governo, estão todas apontadas aos ministros.
Se ainda não percebeu patavina desta conversa, aguente mais um impulso que eu explico. Vamos lá então: Passos Coelho deu instruções aos ministros para não utilizarem os telefones oficiais, optando pelos meios electrónicos das contas do Gmail, ou pelos seus telefones privados, para comunicarem entre si, em vez de usarem a rede de comunicações governamental. O recurso ao Gmail é, dizem, muito mais seguro. É que os servidores estão sediados fora de Portugal, nos EUA e espalhados pelo mundo e são dificilmente violados por ‘intrusos’ nacionais. A haver violador será estrangeiro, o que com certeza não fará importância. Afinal, é coisa de mais ou menos violação por parte de forças ocultas, instaladas sabe-se lá onde. «É uma questão de cautela e de segurança», lê-se num semanário, que adianta que segundo fonte do Executivo, tanto os e-mails como os telefones oficiais «estão a ser usados normalmente, mas apenas em casos de troca de informação não confidencial ou não reservada”. E acrescenta ainda que um ministro comentou: «Eu sou ministro, tenho responsabilidades, e evito falar ao telemóvel de coisas que tenham importância para a República portuguesa. Isso é inaceitável!». Já imagino os ministros a usarem os ditos telefones perigosos para discutirem a pré-época do futebol uns com os outros ou a tratarem de assuntos domésticos,”Não mandes a Maria assar frango para o jantar outra vez”. É inaceitável, disse o ministro. E porquê?, pergunto eu. Então, os rapazes aceitaram o emprego sem saberem ao que iam? Não sabiam que a escuta está na moda? Não escutam os noticiários para se inteirarem do que se passa na Inglaterra, onde todos escutam? O que queriam afinal? Que a troika os deixasse à rédea solta? Isso é que era lindo! Estamos em tempo de revisão completa do país. Revêem-se as leis e os direitos. Ora, em tempos de revisão, também as máximas são outras. Escutai-vos uns aos outros! Mas quem escuta por fim, escuta melhor.
Descansai, ministros desta terra, descansai que haverá sempre alguém que vos escute a vós! Se já vos tinham debaixo de olho, iam lá fazer orelhas moucas a coisa alguma. Ministros de uma República Soberana de um Estado Independente querem-se escutadinhos. E ponham-se a pau, excelências, ou ainda vos colocam a pulseira electrónica.