“Se a lista de deputados não refletir o equilíbrio do distrito proponho uma lista alternativa”

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O deputado socialista Victor Baptista analisa, em entrevista ao DIÁRIO AS BEIRAS, o último ato eleitoral para a Federação Distrital de Coimbra do PS, que perdeu para Mário Ruivo, bem como o próximo congresso do partido e as eleições legislativas antecipadas.

Perdeu a presidência da Federação de Coimbra do PS numas eleições polémicas. Essa situação está ultrapassada?

Tenho tido o cuidado de não ser um elemento perturbador e na última reunião da Comissão Política Distrital ajudei a viabilizar o Secretariado da Federação, com a consciência, como o disse na altura, de que podíamos estar a poucos dias das eleições. E gostaria que o PS estivesse em condições de trabalhar, para que não haja desculpas. Mas não esqueço o que se passou no último ato eleitoral para a Federação, que, para mim, é indescritível, é o exemplo do que se não deve fazer. Continuo ainda hoje a aguardar pela marcação da segunda volta das eleições no distrito, cumprindo os estatutos do PS, uma vez que existiram 29 votos brancos e uma diferença de apenas dois entre os candidatos, e o n.º 6 do art.º 19 dos estatutos refere uma maioria absoluta de votos expressos.

Entende que neste processo faltaram respostas?

Aguardo ainda, passados meses, as decisões da Comissão de Jurisdição Nacional, que não respondeu aos requerimentos apresentados. O Tribunal Constitucional nada decide porque tem o entendimento que ainda se não esgotou a instância interna, que é a Comissão de Jurisdição Nacional. Esta tem de decidir sobre o recurso que apresentei e não decide, o que é lamentável num Estado de Direito. A Comissão de Jurisdição Nacional deliberou dar provimento a um recurso apresentado pelo meu opositor, Mário Ruivo, e até hoje não fui notificado para o exercício do direito do contraditório, e por isso mesmo requeri a nulidade da deliberação. E sobre esta matéria, também continuo a aguardar a decisão da Comissão de Jurisdição Nacional. Julgo que a situação é ridícula. A Comissão de Jurisdição Nacional deliberou revogar a decisão da Comissão de Jurisdição Distrital, que entendeu que as eleições deviam ser repetidas, mas não se pronunciou sobre os factos e a substância subjacente à decisão da comissão distrital. Revogou a decisão na base de um recurso em que não foi dado o direito do exercício do contraditório. Aliás, o único órgão jurisdicional que apreciou a validade e regularidade da substância do ato eleitoral deu-me razão, assim como deu razão à comissão organizadora do congresso.

Como explica esta sucessão de acontecimentos?

A questão não é de saber perder, já ganhei e já perdi, a questão é de transparência e democraticidade do ato eleitoral. Quem me conhece sabe que se eu tivesse tido mais dois votos, eu próprio exigia a repetição do ato eleitoral. Bem sei que há camaradas, aqui do distrito, que entendem que tudo foi feito para me apear e responsabilizam a direção nacional do PS. Sempre disse que assim não seria, não podia responsabilizar todos e muito menos o secretário-geral do PS. Sempre admiti ser um excesso da impreparada “guarda pretoriana”, mas o tempo que aí vem será também o tempo da prova dos nove e é também tempo da constituição da lista de candidatos a deputados e dos órgãos do próximo congresso nacional.

Como perspetiva a distribuição de lugares na lista de candidatos a deputados?

Quem se assume hoje como presidente da Federação do PS de Coimbra foi a mesma pessoa que em determinados momentos teve intervenção política e crítica e fui muito incompreendido, dizendo-se inclusivamente que eu não defendia a Federação. Mas a verdade é que enquanto fui presidente da Federação, as listas de deputados, aprovadas pela Comissão Política Distrital, foram sempre respeitadas e aceites pela direção nacional. Estou para ver se na próxima assim será e se afinal a Federação tem voz junto de Lisboa ou se a perdeu. Atualmente presido à mesa da Comissão Política Distrital e se considerar que a lista não reflete os equilíbrios e representatividade do PS no distrito de Coimbra apresentarei uma lista alternativa para votação. O PS é um partido democrático, tem história, e nem sequer seria inédito. Já noutro momento a lista de deputados foi constituída por votação um a um.

Espera integrar a lista de deputados?

Se não a integrar não deixarei de dormir descansado, tenho a consciência tranquila. Represento 50 por cento dos socialistas da Federação de Coimbra, a que presidi durante três mandatos. Afirmei-me politicamente no país e sei o trabalho e os contributos que desenvolvi na Assembleia da República. Defendi com equilíbrio os interesses do distrito de Coimbra. Por vezes houve quem ficasse incomodado com a minha opinião, mas nunca deixei de ser solidário com o Governo. E como em política não há mortes anunciadas continuarei com certeza uma vida política ativa.

Tradicionalmente a lista de candidatos a deputados por Coimbra é encabeçada por uma figura nacional. O secretário de Estado Paulo Campos é um dos nomes falados. Concorda?

A vida político-partidária de Paulo Campos no distrito de Coimbra não tem sido nenhuma, com exceção do último combate federativo. Só há um ano, penso que reativamente, se transferiu para a Federação de Coimbra; digo reativamente porque já na altura das últimas eleições desejava ser cabeça de lista por Coimbra. Enquanto fui presidente da Federação nunca prometi cargos a troco de votos, não prometia o que não podia cumprir. Os cabeças de lista são opções amadurecidas pela direcção nacional do PS e, em particular, pelo secretário-geral do PS, que tem uma voz decisiva. Se o desejar como cabeça de lista nada tenho a contradizer, a não ser a opinião pessoal de que não é um real ganho político eleitoral no distrito de Coimbra. Será uma solução de tensão, que não serve os interesses do PS e, sobretudo, dos cidadãos do distrito. Aguardo também a intervenção da direção nacional e do secretário-geral nesta matéria.

O que é que o próximo congresso pode trazer de decisivo para o PS?

Este congresso foi calendarizado antes desta crise política, melhor seria que tivesse sido adiado, mas também reconheço que não existiam condições para o seu adiamento. Está assim justificado e legitimado o próprio secretário-geral e espero que seja um momento de debate, mas sobretudo de unidade dos socialistas.

Como analisa a atual situação do país?

A situação do país no próximo ato eleitoral resulta de uma crise política que ainda está a agravar mais a já débil situação financeira de Portugal. E a situação no distrito não será muito diferente da situação nacional. Vivemos momentos de grande instabilidade financeira na Europa e em Portugal, embora alguns insistam em esquecer a questão internacional. Depois do que se passou na Grécia , na Irlanda e em agora em Portugal, temo o efeito de contaminação a Espanha. Se assim acontecer, uma vez que Espanha tem um terço da dívida portuguesa, temo que possamos ter um efeito sistémico na Europa, com consequências imprevisíveis. O PSD abriu uma crise política e esqueceu o país. O dr. Passos Coelho não só trocou as voltas ao dr. Rui Rio, nas suas perspetivas, mas iniciou uma caminhada que pode contribuir para o fim da moeda única europeia. E se assim for o país fica numa situação muito complexa.

Na sua opinião, qual é o principal desafio que se coloca ao PS, no distrito e no país, no próximo ato eleitoral?

Não somos um país rico, há que reconhecer que muito fizemos, mas temos que ter em atenção os meios financeiros para garantir a sustentabilidade da área social, e em particular da segurança social. Fizemos muitas coisas boas nos últimos anos, mas há quem persista em ignorar a crise internacional, o que é um passe de magia que não enganará os portugueses. O distrito de Coimbra tem tido um conjunto de investimentos ao longo dos governos do PS, desde António Guterres. Resolveram-se as questões de vias de comunicação, do Hospital Pediátrico, melhoramos muito as escolas, construímos autoestradas, há um trabalho transversal que foi desenvolvido em diversas áreas e penso que os conimbricenses não o esquecerão. Quanto ao metro de superfície, fui, desde a primeira hora, um dos deputados que disse que o projeto não poderia nem deveria ser abandonado, mas assumi que era necessário fazer a sua recalendarização, de acordo com as possibilidades financeiras do país, com a reutilização dos meios afetos no âmbito de QREN e na versão que o viabiliza do ponto de vista financeiro e da exploração. O metro tem que ser construído, mas com estas preocupações, seja com este governo ou com outro.

Estas eleições são difíceis para o PS?

Todas as eleições são difíceis para quem governa em tempo de crise. É fundamental que os maiores partidos políticos, aqueles que têm tido responsabilidade no governo, e que é previsível que possam ter, se entendam. Tenho dúvidas que o ato eleitoral seja o melhor caminho, que vá resolver alguma questão. Se não se encontra um governo maioritário, as coisas tornar-se-ão muito difíceis para o país. Admito que seria desejável um entendimento pré-eleitoral, mas não é previsível que assim aconteça. E o Presidente da República não pode fazer como Pilatos, tudo tem que fazer para que haja uma solução governativa estável. O país não pode ter mais instabilidade, porque os credores deixam de financiar e um dia destes são os próprios salários dos portugueses que estarão em causa.

Como vê a possível entrada do FMI?

A entrada do Fundo Monetário Internacional não é uma solução, embora isso seja defendido por alguns, que parecem desconhecer que a situação tornar-se-á ainda mais grave para os portugueses. Admito que haja responsáveis políticos que queiram, de uma forma objetiva, que outras instituições assumam as políticas, necessárias ao país, que eles próprios não têm coragem de assumir.

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