“Fizemos com que as pessoas acreditassem que é possível”

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Foto Luís Carregã

Como tem sido a adaptação à cidade e ao clube?

Fácil, em virtude daquilo que foi para mim chegar à Académica. Vim em missão e quem vem em missão está preparado para viver no ar, na terra e no mar. Nesse estado, procurei que todos pudessem estar comigo e as coisas têm sido naturalmente fáceis, se bem que mudar um conjunto de hábitos para viver em missão é sempre complicado.

A família acompanhou-o nesta “missão”?

Claro que sim. Não fazia sentido estarem fora do meu local de trabalho permanentemente durante 24 horas. A família está comigo como sempre esteve e como eu entendo que deve ser.

Passou muitos anos aqui bem perto. Já foi matar saudades da Figueira?

Não fiz questão, nem tive oportunidade para isso.

Chegou à Académica com o objetivo de fazer esquecer os últimos resultados e devolver a alegria de jogar à equipa. Está a conseguir dar conta dessa missão?

O que posso revelar é que os jogadores conhecem na perfeição a minha ideia de jogo e estão a procurar a cada dia que passa interpretá-la melhor. Mais fácil do que isto seria a complexidade de não arrastar comigo aqueles que a têm de executar. Mas eles estão empenhados em responder a essa ideia de jogo, que passa também, depois de conversarmos, por as ideias deles serem as mesmas que a minha. Assim tudo é mais fácil.

Já treinou equipas como a Naval, o Marítimo, o Paços de Ferreira… A Académica é mesmo um clube diferente como dizem os adeptos?

Todos os clubes têm uma característica comum: a ambição de serem melhores e de ganhar. Mas todos têm uma identidade que é característica de cada um. A Académica é um clube que, quando alguém olha para ele de fora, percebe que algo se passa. Não é na hora da despedida que Coimbra é diferente. Penso que é na hora de chegada e foi isso que eu percebi. Quando cheguei, vi que estava num clube com uma dimensão que já imaginava, mas pelas características da cidade – que está muito envolvida no clube – percebi que é um clube com características diferentes. Vive-se permanentemente a Académica, como se vive 24 horas por dia o estar em Coimbra. Coimbra não pára e quem é adepto da Académica também percebe que este é um clube que não pára. É evidente que isto nos motiva e faz-nos sentir maiores do que podemos pensar que somos. Isso é para mim um fator de motivação e que me obriga a transcender também.

Quando saiu do Paços de Ferreira decidiu esperar até encontrar um desafio a altura, disse-o… Este é o desafio que estava à espera?

Havia três fatores associados à minha tomada de decisão. Primeiro, queria continuar um percurso que sempre fiz por merecer. Dar continuidade ao meu trabalho, onde eu entendo ser o mais alto patamar do futebol europeu, que é trabalhar na Liga. Estou também talhado para um conjunto de desafios de grau de dificuldade elevado. E também gostaria de poder juntar a isto os aspetos económicos, sendo, no entanto, prioridade os desportivos. Encontrei na Académica aquilo que eu pretendia e não fugi do caminho que tracei. Se estivesse desesperado, teria muito cedo enveredado por outro caminho, no estrangeiro, por exemplo.

Como classifica as condições de trabalho que tem à disposição?

Se tivesse de comparar com a grande maioria dos clubes, diria que a Académica está muito perto dos melhores. É importante corresponder com capacidade e identidade que traga vitórias para que a classificação seja condizente com essas condições. Queremos que, no futuro, não só o clube cresça, como também cresça uma ideia e um compromisso. Estou convencido de que, no futuro, quem trabalha com estas condições tem de evoluir.

É uma responsabilidade grande a que tem em mãos para o jogo de domingo?

Queria separar duas coisas: o lado profissional e o lado emotivo que está associado ao lado profissional. Para mim, é um jogo que quero ganhar. Sei quais são as regras do jogo. Temos um resultado adverso e primeiro queremos alcançar um resultado e partir depois para outro. Isto não me dá mais responsabilidade nem me compromete. No plano emotivo, tenho a certeza que o plano que preparei – e que tenho transmitido para o grupo – é responsável, de risco, mas de risco calculado, para que emocionalmente possamos estar equilibrados. Depois do jogo, tenho a certeza que o meu lado emocional vai ser bem visível, porque sou uma pessoa de emoções.

A Académica e o Ulisses já conseguiram este ano vencer o V. Guimarães. Acredita que é possível passar em frente?

Essa vitória faz parte do passado. O que queremos agora é perceber em que estado estamos. Qual é o nosso alinhamento perante a competição. Qual é a nossa postura perante o compromisso e aquilo que desejamos temos de o demonstrar. Se conseguirmos estar nesse estado é mais fácil ultrapassar o desafio. Se isto não acontecer, provavelmente temos de perceber em que estado estamos, mas ultrapassar o adversário é mais difícil.

Sente que os jogadores também encaram esta partida de uma forma especial?

A mensagem foi fácil de passar, tendo em conta que há já muito tempo que eles perceberam a importância do encontro. Mas este jogo não deixa de ser tão importante como todos os outros que já disputámos e que ainda temos pela frente. Mas, se não nos condicionarmos com a grandeza e a importância do acontecimento, se olharmos para nós e não nos preocuparmos com o adversário e a importância deste jogo, provavelmente estamos a dar muito mais importância ao que queremos fazer. É nesse estado que eu queria que eles estivessem. Alinhados com o compromisso que têm, com as ideias que têm e o resto vai chegar naturalmente.

E você? Também teve de vasculhar na história da Académica para se inteirar do espírito?

Mesmo que não fosse essa a minha ideia, os adeptos obrigavam-me a isso. A permanente abordagem que fazem comigo nesse sentido era o bastante para me obrigar, se eu não o tivesse pensado fazer. No entanto, como disse, vim para a Académica completamente preparado e com o espírito de missão. Procurei rapidamente perceber onde estava para direcionar a estratégia para abordar aquilo que é a Académica e perceber de que forma conseguiria fazer mais felizes todos os que são da Académica. O meu contributo só é importante se eu estiver bem direcionado. Sei onde estou e para onde quero ir. E isso é importante.

Durante a semana foram muitas as manifestações de apoio à equipa. Têm tido reflexo na moral do plantel?

É importante que eles se consciencializem da dimensão da partida antes do apito inicial. Tudo isto serve de fase preparatória. Perceber que há uma envolvência diferente, que provavelmente vai haver uma moldura diferente e que o palco que vamos encontrar não é fator de surpresa. Os adeptos, se calhar de uma forma inconsciente, obrigaram-nos a fazer a preparação do plano de jogo de uma forma mais efetiva. O que, para nós, foi ótimo.

Tem-se falado muito da possibilidade de este ser um momento de viragem no clube. Acredita nisso?

Não só espero que sim, como o desejo e acredito. Não tenho dúvida absolutamente nenhuma. Mas, sobre isso, queria dizer que aquilo que temos vindo a construir neste mês, desde que cheguei, foram os alicerces de confiança, segurança e credibilidade para que agora haja mais pessoas a acreditar em nós. Penso que essa recuperação de identidade tem sido feita. Não está terminada e é um processo que não tem fim, mas o importante e fundamental era restituir a todos a confiança para o grau de probabilidades de êxito aumentar. Acho que as pessoas agora estão mais unidas, porque o que fizemos no passado recente fez com que pudessem acreditar. Isto revelou-se nesta manifestação de confiança e tenho a certeza de que vamos conseguir.

Se a Académica for à final da Taça disputará as competições europeias no próximo ano. De que forma é isso estimulante e que peso teve na sua vinda para Coimbra…

Para poder chegar a Lisboa é preciso passar várias “cidades”. Foi o que fomos fazendo nos jogos que tivemos. Temos agora um desafio que nos pode levar ao campo de batalha que é a final. Só temos de ultrapassar esta última “cidade” para chegar à capital, mas queremos fazê-lo com grandes probabilidades de êxito. As “cidades” que já ultrapassámos já são passado e agora há uma última que é tão importante como a que vamos encontrar quando chegarmos à final. Depois de a passarmos, perceberemos a grandeza que é lá estar. Se não conseguirmos perceber a importância deste último ataque, então, provavelmente, não estamos preparados para a final. Queremos reunir todas as condições de perceber que o sucesso de pensar mais além está no pensar no imediato. Na “Europa” e em todas essas coisas pensaremos depois.

Chegou quase no final da época. As coisas teriam sido diferentes, ou serão diferentes, quando preparar a equipa desde o início?

Não fui eu que preparei a equipa, mas, quando aceitei este desafio, sabia com o que contar e aceitei que, com estes jogadores, quereria e poderia fazer melhor. Para mim não existe o “se”. Foi desta forma que aceitámos e será com estes jogadores que vou até ao fim. Estes são sempre os melhores, porque são os que tenho à disposição.

Fala muito de um compromisso com o plantel. É um acordo apenas dentro do balneário ou é transversal à direção também?

Sem especificar, posso dizer que há compromissos que são assinados e outros que, não sendo assinados, são compromissos de honra. Os compromissos comigo, quando se trata de homens – e os jogadores que tenho à minha disposição são homens – são sempre compromissos de grande lealdade. Quem está disposto a aceitá-los vai ter de viver ou morrer em conjunto. É um compromisso muito lato e com uma abrangência muito grande no aspeto profissional e emocional, que obriga homens a um conjunto de ideias. Tenho a certeza que ninguém quer ficar de fora desse compromisso, porque estou a lidar com homens.

Como foi o outro compromisso. Aquele que estabeleceu com o presidente da Académica. Foi fácil o acordo?

As coisas nunca são tão fáceis assim, nem são tão complexas. Houve primeiro de cruzar um conjunto de ideias, valores e princípios, para percebermos que havia condições em comum. O resto torna-se tudo mais fácil. Quando o projeto me foi apresentado, percebi que era possível encontrar-se com aquilo que eu desejava e isso tornou tudo mais fácil.

O processo em tribunal que envolve o presidente tem tido algum tipo de reflexos no grupo?

Não me compete a mim falar sobre assuntos pessoais. Mas, na qualidade de presidente, o papel dele tem sido exatamente o mesmo para connosco. Mas, sabendo que, por trás do presidente existe um homem, o momento para com ele é sempre de solidariedade, atenção e compreensão. É esse estado que vivemos quando estamos em grupo. Ele faz parte do nosso grupo, portanto será sempre alguém que terá a nossa solidariedade.

Estamos a chegar a uma altura em que podem haver mudanças no clube, já que vão decorrer eleições. Isto de alguma forma condiciona a sua forma de pensar na próxima época?

A minha atenção e concentração está toda virada para dois fatores neste momento. Primeiro, nesta altura, a meia-final da Taça e, depois, o campeonato, já que ainda não alcançámos o principal objetivo. É minha obrigação e responsabilidade pensar em tudo isto, que pode surgir quando alcançarmos o êxito que pretendemos, que é preparar a próxima época. Tenho já ideias sintéticas sobre isso, mas não em profundidade, porque neste momento quero direcionar todas as atenções para o que é prioridade.

Também desportivamente é uma altura de decisões. Tudo pode ficar definido depois do próximo jogo do campeonato?

Teremos tempo de pensar sobre ele. Neste momento estamos a reunir o máximo de ideias e de compromisso para o próximo jogo, que é tão importante, para toda a gente e para nós. É essa a prioridade para nós. Quanto mais depressa encontrarmos o equilíbrio e o bem-estar melhor. Vamos, obviamente, trabalhar para que o sucesso chegue o mais rapidamente possível.

Que mensagem gostaria de deixar aos adeptos para este jogo especial?

Temos a perfeita noção de que o grupo sozinho, sem apoio, tem uma tarefa muito mais difícil. O apoio traz a motivação. Se os adeptos, sócios e a Mancha Negra forem permanentemente o 12.º jogador e estiverem sempre empenhados no sentido de dar confiança, é um fator essencial. Aquilo que lhes peço é que não nos deixem durante os 90 ou 120 minutos. Neste mês, demos uma resposta a todos de que podem contar connosco e que seremos mais fortes se acreditarem em nós e se nos trouxerem para dentro do campo o estímulo de não desistir. Quando as coisas aparentemente estiverem difíceis, que surja uma voz a dizer “levanta-te”. Volto a pedir que façam tudo o que é possível e impossível, para que, durante o tempo que estivermos em campo, possamos ser felizes e, depois de o jogo terminar, podermos partilhar essa felicidade com todos.

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