O cenário de asfixiante dramatismo com a pobreza a aumentar estende-se a todo o país. Diariamente, damos conta da miséria que atinge os lares de desempregados, das pessoas sem apoio social, dos doentes sem capacidade para adquirir medicamentos, das solidões sem respostas humanas, dos lares de instituições repletos e com centenas à espera de vaga, dos doentes/curados abandonados nos hospitais, da escalada do sofrimento, do aumento de roubos, da violência doméstica, das crianças a passar fome e de tantos e tantos casos de ruptura humana por mor de alguns que olharam e vêem, apenas, o seu umbigo de enriquecimento. Uma angústia nacional.
É deplorável que ao lado ou próximo dos pobres vivam pessoas com vencimentos e mordomias que são um brado de revolta e autênticos ultrajes ao homem, e fiquem insensíveis. E, são mais de dois milhões que vivem pobremente! E, desde 1 de Novembro foram cortados os abonos a 373 famílias e baixaram os mesmos abonos a um milhão de famílias. E, cerca de 230 mil recebem, para sobreviver, apenas a irrisória esmola de cinco euros. E, a quantos e quantos com família para sustentar e despesas obrigatórias para pagar pedem, ainda, austeridade! “Austeridade que, como afirmou D. Jorge Ortiga, “sem forte intervenção na correcção dos desequilíbrios inaceitáveis e de provocantes atentados à justiça social, não tem sentido”. Impõe-se, diz o prelado, “pôr cobro à atribuição de remunerações, pensões e recompensas exorbitantes e dar dignidade às pessoas, porque o lucro excessivo conduz à desumanização da vida”. Um país sem valores de solidariedade e de justiça, despido de consciências activas para ajudar os necessitados, constrói “clusteres” de miséria, de ruína e de marginalidade.
Ao lermos que na cidade do Porto, 1% da população são pessoas sem-abrigo, que são cada vez mais os portugueses da classe média que recorrem à sopa dos pobres ou aos cabazes do Banco Alimentar, que se multiplicam os pedidos de ajuda à Cáritas (passaram de 5.000 para 62.000) e às Misericórdias (ajudam mais de 280.000 portugueses, um aumento de 250%) e que nas restantes IPPS e instituições da Igreja se ampliam, diariamente, os pedidos de ajuda, como afirmou o cónego João Castelhano, ao mencionar que no Centro João Paulo II os pedidos passaram de 61 para 131 famílias, uma parte das envergonhadas, podemos compreender, melhor, a angústia, o desespero e a revolta que minam uma significativa da população.
Devemos acrescentar a fome que grassa em crianças que têm, praticamente, a refeição da cantina da escola e ao fim de semana pouco ou nada comem. A título de exemplo referimos, como nos contaram, que numa escola desmaiou uma aluna e foi levada ao hospital. O diagnóstico concluiu que o mal resultara de não ter sido alimentada. Não comera ao jantar, nem ao pequeno almoço e na hora do almoço, por lhe faltarem 85 cêntimos, viu-se privada da refeição. Que esperam as actuais gerações de jovens quanto ao futuro se a falta de trabalho e o desemprego são o pão nosso de cada dia?