Carlos Barbosa: “queremos que o mercado baixe o preço dos combustíveis”

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Carlos Barbosa é presidente do Automóvel Clube de Portugal, vice-presidente da FIA e representante da Federação Internacional do Automóvel (FIA) junto da Comissão Europeia. Na entrevista que publicamos, mantém a frontalidade de sempre. Na questão dos combustíveis afirma que a “guerra” é que haja condições de mercado para que os combustíveis baixem.

P – De acordo com o que está anunciado em matéria de impostos, 2011 promete ser um anno horribilis para os automobilistas portugueses e também para a empresas do sector automóvel. No seu entender existem alternativas, nomeadamente na questão da receita a arrecadar pelo Governo?

R – Infelizmente o setor automóvel é há vários anos um grande sorvedouro de receitas fiscais para o Governo. Em vez de verem o setor automóvel como impulsionador da economia, insistem em penalizá-lo de uma forma brutal e o que se perspetiva para o próximo ano não é nada bom.

P – Está na hora de “tocar a reunir” por parte de condutores, importadores, distribuidores e empresas de reparação?

R – O ACP não promove manifestações. Mas se as houver, o Governo tem de ter a consciência que o País pára!

P – A implementação das portagens, como defendem alguns comentadores, devia ter chegado há mais tempo?

R – O ACP sempre defendeu o princípio do utilizador-pagador, mas sempre quando existam alternativas e essas vias ofereçam segurança rodoviária. O que aconteceu foi o que se passa em muitas outras áreas, começaram a casa pelo telhado. Isto é, antes de portajar o que quer que fosse, deviam ter investido na requalificação das estradas. O projeto da EN125 é um bom exemplo do que já devia ter sido feito. Esta estrada está aprovada há 4 anos e ainda não começaram as obras…

P – Os condutores portugueses devem conformar-se com a carga fiscal ou podem, ainda, recorrer a Bruxelas? O ACP tomou medidas a este nível? Obteve respostas?

R – Apresentámos queixa à Comissão Europeia quanto à dupla tributação (do IVA e ISV) na compra de carros novos e ao fim de mais de dois anos o Governo lá veio reconhecer a irregularidade, até a inscreveu no OE deste ano, mas ao abrigo de uma autorização legislativa, parece ter adiado essa correção para as calendas. Quanto aos restantes impostos, não alimentamos ilusões. Mesmo os incentivos fiscais à compra de automóveis elétricos estão a diminuir e a probabilidade de virem a ser taxados de igual forma que o são os restantes automóveis é muito grande. Quando o governo não consegue suster a dívida pública, aumenta impostos…

P – A rede viária nacional reflete o esforço dos contribuintes portugueses ou estes continuam a pagar demais para as estradas que temos? Temos, a este nível, um país dividido ao meio, ou seja, um litoral desenvolvido e um interior à espera de “novas oportunidades”?

R – Não, nem litoral nem interior merecem as estradas que têm. Pagamos imenso para tão pouca qualidade. E nas auto-estradas, pagamos enormes portagens quer elas estejam em obras quer não, quer tenham a segurança diminuída quer não.

P – A Prevenção Rodoviária é eficaz na formação das novas gerações ou é necessário alterar o modelo?

R – A prevenção rodoviária deve ser iniciada logo na infância, ao exemplo do que hoje se faz com o meio ambiente. O que é necessário alterar é a abordagem que se faz a esta matéria e investir em campanhas eficazes e nas escolas.

P – Os índices de sinistralidade são consequência do estado da atual rede viária, da deficiente preparação dos condutores ou são, acima de tudo, um problema cívico?

R – De tudo isso um pouco e também das penas serem muito brandas. A preparação dos condutores é péssima, a maioria vai para a escola tirar a carta, não vai aprender a conduzir. Até já há escolas de condução ‘low-cost’! Depois vão para a estrada sem saber nada e em caso de sinistro grave o que é que acontece? Nada ou muito pouco. O exemplo tem que vir de cima, e há mesmo necessidade de implementar a sério a cassação das cartas de condução.

P – A formação dos novos condutores está de acordo com a evolução do automóvel e o estado da rede viária, por exemplo?

R – Pelos motivos que referi acima, não.

P – Qual é o ponto da situação da “batalha dos combustíveis”? Receia retaliações pelas atitudes que assumiu? O que espera obter com as posições que tem vindo a defender?

R – De todo. Se a ideia era intimidar ou retaliar, só posso dizer que estão a perder tempo. O ACP, muitos parecem não saber, é uma associação de defesa do consumidor e, ao abrigo desse estatuto, tem o dever e o direito de questionar tudo aquilo que entende ser lesivo dos interesses dos automobilistas. No caso dos combustíveis, a nossa posição foi sempre muito clara: pagamos preços excessivos, existem indícios de concertação dos preços e a Autoridade da Concorrência, a quem compete assegurar o bom funcionamento do mercado, nada faz. Limita-se a redigir relatórios de mil páginas para mostrar serviço, mas que na realidade não vão nem de perto nem de longe ao cerne da questão. A Galp pôs-nos um processo ridículo. A “guerra” não é contra a Galp ou alguma gasolineira! A “guerra” é que haja condições de mercado para que os combustíveis baixem. É fundamental que as nomeações para a Autoridade da Concorrência saiam da esfera do governo e passem para a Assembleia da República.

P – Como é que antevê o futuro: elétrico a 100 por cento ou híbrido? Deixamos a GALP… abraçamos a EDP?

R – Não acredito que a mudança de mentalidades em relação à mobilidade passe por escolher híbridos, elétricos ou o que quer que seja. O automóvel, seja ele movido a gasolina ou a eletricidade, vai ser sempre necessário. Às vezes parece que há quem queira impor uma ditadura dos transportes públicos, esquecendo a realidade em que nos inserimos e também que a mobilidade agrega todos os meios de transporte.

P – O Governo tem investido bastante na questão das alternativas aos combustíveis fósseis, promovendo, até, várias ações de promoção dessas mesmas soluções. Concorda com as opções tomadas da este nível?

R – Ações de promoção dessas soluções… ou do Governo?

P – O ACP, através da ação do Presidente Carlos Barbosa, transformou-se na “Deco” de todos os utilizadores do automóvel em Portugal?

R – O ACP é uma instituição de utilidade pública de defesa do consumidor fundada em 1903. Não é o Carlos Barbosa.

P – Foi eleito para o cargo de Vice-Presidente da FIA, ficando a tutelar a Mobilidade e o Turismo. É também o representante da FIA junto da Comissão Europeia para o Desporto Automóvel e, a título pessoal, representante da Região I da FIA (Europa, Médio Oriente e África) no Conselho Mundial da Mobilidade. Quais são as consequências práticas das funções atrás referidas? Portugal retira benefícios?

R – Fui eleito a título nominal, mas obviamente que é um lugar que leva Portugal a mais um patamar internacional. A FIA, como o nome indica, federa só na União Europeia mais de 35 milhões de automobilistas através de 71 clubes-membros. Portugal retira muitos benefícios, pois tenho acesso a toda uma experiência e documentação internacional que tento transportar para o nosso País. Mas não é fácil…

P – A edição 2011 do Rali de Portugal está garantida. E nos próximos anos?

R – O Rali de Portugal é um evento do país, não é do ACP. O Estado investe dois milhões e recebe sempre acima dos 80 milhões. Só a ele cabe decidir se quer continuar a patrocinar em vez de andar a operar eventos e empresas na falência.

P – A Fórmula 1 é uma carta definitivamente fora do baralho ou podemos sonhar com o regresso da F1 daqui a 10 anos, por exemplo?

R – Garante milhões, mas para isso é preciso que o Governo esteja disposto a investir 25 milhões. Se isso acontecer, a F1 é uma realidade em Portugal. Caso contrário nem vale a pena sonhar.

P – Neste momento, o desporto automóvel atravessa um momento, no mínimo, complicado; da Velocidade aos Ralis. Quais são as medidas que preconiza para a sobrevivência do desporto automóvel no nosso país?

R – A crise veio, como é óbvio, afetar o desporto automóvel. Penso que nesta fase é importante adequar as provas e os regulamentos ao parque automóvel existente e deixarmo-nos de ter sonhos!

P – Félix da Costa brilhou nos testes, no Dubai, ao volante de um Force India; Filipe Albuquerque bateu o novo Campeão do Mundo de F1, Sebastian Vettel na Race Of Champions. Não temos GP, mas poderemos ter um piloto na F1?

R – Veja o que a Espanha fez com Alonso. Investiu milhões nele e já teve 20 vezes o retorno para o país. Os apoios deviam ser, quer do Desporto quer do Turismo, cada vez mais seletivos Claro que podemos ter um piloto da F1, mas tem se ser o Estado a apoiar a lá chegar. Depois, se é bom tudo é fácil. E o País agradece.

P – O êxito de Armindo Araújo no Mundial de Produção está a ter o devido aproveitamento (promoção do país no capítulo turístico, por exemplo) a nível internacional? Poderá chegar ao WRC?

R – Não, pelas razões anteriores! O Armindo anda sempre aflito a pedir apoios, quando há dois anos que podia estar no WRC.

P – O ACP é neste momento um clube à imagem do Presidente Carlos Barbosa ou ainda há algum caminho para percorrer? O ACP reforçou a aposta em Coimbra através da presença no CC Dolce Vita. Estão satisfeitos com a aposta?

R – Se não tivesse sempre projetos em agenda, o ACP já tinha morrido. Somos o maior clube português, com mais de 245 mil sócios, e temos uma mão cheia de novos objetivos para 2011. Em Coimbra temos vindo a reforçar a nossa presença precisamente porque temos cada vez mais sócios e isso enche-nos de orgulho. Será em Coimbra que no próximo ano iremos inaugurar um dos novos projetos, uma espécie de Portugal dos Pequeninos para o mundo automóvel – em colaboração com a Câmara Municipal de Coimbra, vamos ter um espaço onde as crianças vão poder experimentar todas as vertentes relacionadas com os automóveis, da mecânica às polícias, da condução desportiva às escolas de condução. O ACP não é o Carlos Barbosa. É uma equipa de profissionais excecionais que cumprem à regra a estratégia de toda uma direção forte e unida, para fazer o club crescer cada vez mais e melhor.

P – Considera o inconformismo que evidencia em muitos temas a “receita” indicada para colocar o país no caminho certo? Se pudesse demitia o Governo?

R – Sou presidente do ACP e a Constituição da República Portuguesa não prevê qualquer competência para o meu cargo…

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