Vanguarda, muito da vanguarda artística em Portugal tem tido Coimbra como epicentro. Isto apesar dos holofotes mediáticos nunca terem estado focados, como continuam a não estar, para lá de Lisboa e do Porto, o que, desde logo, condiciona a afirmação da condição mesma dessa vanguarda. E se tem sido assim em campos como o do teatro, mais ainda o é no que respeita às artes plásticas, numa realidade expressa numa sigla: CAPC.
O Círculo de Artes Plásticas de Coimbra (CAPC), organismo cinquentenário e “lugar mágico” por onde passaram todos os nomes importantes da vanguarda das artes plásticas portuguesas, inicia agora uma “segunda vida”, não assumida como qualquer movimento de rutura com o seu passado recente, mas antes como “um tempo outro”, como salienta Carlos Antunes, o arquiteto que assumiu recentemente – com Désirée Pedro, Mafalda Moreira, Alexandre Pedro e Valdemar Santos – a direção do organismo, que nas últimas duas décadas, teve em Vitor Dinis o grande “pensador” e “construtor”.
Recusando, “por não acreditar”, numa “ideia” de CAPC “novo”, Carlos Antunes diz preferir “assumir uma herança” e “pensar um projeto no CAPC não esquecendo os seus 50 anos”. Mesmo porque, insiste, “antes desta direção há esta coisa extraordinária que é o CAPC. Uma instituição que, de facto, foi absolutamente relevante para a história da arte contemporânea em Portugal”.
E diz mais o responsável. Diz que “a história da arte contemporânea em Portugal seria outra se o CAPC não tivesse existido”. Porque “por aqui passou toda a gente. Desde as pessoas que hoje tomam as decisões políticas, como o Dr. Rui Vilar [que esteve recentemente a apresentar o livro de Hilda Moreira de Frias sobre os 50 anos do CAPC], às pessoas que continuam a ser os artistas de referência” em Portugal.
Para Carlos Antunes, “o CAPC foi esse lugar mágico onde toda a gente se encontrou”. Mas, “o CAPC é hoje necessariamente diferente porque as pessoas são outras”, assume, chamando a atenção para a direção dos últimos 20 anos, assumida por Vitor Dinis, a quem reconhece “um trabalho extraordinário, contra tudo e contra todos, numa altura em que a contingência cultural e política foi tremenda para a vanguarda”.
Desse trabalho, Carlos Antunes destaca as instalações novas – no Parque de Santa Cruz –, que “são uma sua [de Vitor Dinis] conquista absoluta”, mas também “uma coleção feita nos anos 90, o que, com as tremendas dificuldades vividas, é ainda mais significativo”.
Mas foi na sede histórica do CAPC, à rua Castro Matoso [logo ao descer das monumentais], que a reportagem do DIÁRIO AS BEIRAS encontrou Carlos Antunes (presidente da direção) e António Olaio (presidente do conselho artístico), os dois responsáveis pelas grandes decisões relativamente a uma programação que se pretende de “abertura e encontro entre vanguardas”.
Assumindo um protagonismo novo, esse sim, para o conselho artístico – entidade onde se encontram António Olaio e Alice Geirinhas –, Carlos Antunes destacou a “importância” de fazer deste “uma entidade mais atuante”, sobretudo quando é dirigido por alguém como António Olaio que, para o responsável pela direção do CAPC, “é hoje, dos artistas que vivem Coimbra, o mais relevante”.
Por lá, no edifício da Castro Matoso, a necessitar de um intervenção de fundo, Carlos Antunes e António Olaio davam forma a uma exposição a ser “reinaugurada”, depois de ter aberto “simbolicamente” aquela que é a sede histórica do CAPC, no dia do lançamento do livro sobre os 50 anos do organismo, o que aconteceu com a presença de Emílio Rui Vilar, fundador do CAPC e atual presidente da Fundação Gulbenkian.
E nessa exposição, vê-se, é percetível, que “a força do CAPC tem sido um pouco, ao longo de toda a sua história, essa capacidade de criar ruturas e, a partir dai, inventar um futuro novo”, como salienta Carlos Antunes.
Por lá também, simbolicamente, “desagua” o CAPC que Carlos Antunes e António Olaio pretendem “devolver” à cidade e ao país, num encontro entre peças “absolutamente singulares do património artístico” em Portugal, “curtecircuitadas” com a introdução de peças novas. Exemplo: na sala com as peças de Túlia Saldanha, introduziu-se uma peça de Ana Rito, “porque dialogam bem uma menina contemporânea a olhar para uma bela coleção de peças”.
E,de facto, assumi-
damente, “é este CAPC fraturante, que procura pontes com o passado, curtecircuitando-o às vezes, mas exaltando até questões de natureza plástica [como aqui fica explícito], que interessa” aos dois responsáveis.
Quanto à cidade – “que se cansou de chorar as mágoas na esplanada do Tropical” – e à abertura “que se sente e é necessária”, Carlos Antunes acredita “que se vive hoje um momento extraordinário de mobilização, tanto no que respeita à promoção de atividades, como na procura e na adesão que encontram”. E esse é um bom presságio.